Por acompanhar o ecossistema de empreendedorismo no Brasil há quase uma década, aprendi algumas lições que dão uma clareza muito peculiar da importância das companhias investirem em inovação aberta. Isso porque percebi na prática que existe uma complementaridade importante entre as startups e as corporações no Brasil e no mundo.
Afinal, é fato que as empresas precisam inovar para sobreviver no mercado atual, especialmente no sentido de desburocratizar processos, trazer novidades para os consumidores e manterem-se competitivas diante da concorrência. E, no lado das startups, os empreendedores seguem à procura de oportunidades de negócios e canais comerciais para dar vazão aos seus MVPs, bem como parcerias que possam melhorar seu branding e credibilidade diante do mercado. Reparou que é quase um match perfeito?
Os processos de inovação aberta surgem nesse meio de campo como uma oportunidade para que essas parcerias possam acontecer nos mais diversos níveis de envolvimento, desde programas de aceleração e incubação, chamadas e desafios pontuais para resolver questões das corporações, spin-offs, espaços de co-working até iniciativas de investimento mais robustas, como os Corporate Venture Capitals (ou CVCs), ou até mesmo fusões e aquisições.
Independente do formato de inovação aberta utilizado por uma companhia, aprendi nos meus anos de Wayra que existem cinco principais lições para quem quer levar a inovação aberta para dentro da sua companhia: (1) defina claramente os objetivos do relacionamento com startups (2) planeje no longo prazo, (3) engaje suas lideranças, (4) mantenha a chama da inovação acesa e (5) esteja aberto à mudanças.
A empresa entendeu a importância de trabalhar com startups como forma de inovação aberta e quer começar essa relação? Ótimo. Agora, defina claramente os objetivos do relacionamento com startups. Em um primeiro momento pode parecer simples, pois qual startup não iria gostar de se relacionar com nossa empresa, mas não é. Um bom relacionamento começa com objetivos claros sobre o que queremos atingir com esse trabalho em conjunto. Busque entender internamente o que pode ser oferecido às startups e combine o que espera em contrapartida. Dependendo da forma de relacionamento e momento da empresa, os objetivos podem mudar. Não há problema, defina novamente de acordo com a necessidade e deixe claras as suas intenções.
Entendido o objetivo desse relacionamento, é crucial planejar no longo prazo. Um processo de inovação aberta precisa ser parte do planejamento da empresa, seja ele estratégico ou financeiro, porque o retorno virá com o tempo, seja por meio de um portfólio que retorna dividendos ou via novas oportunidades de negócio, como a criação de novos produtos, melhorias na cadeia de fornecedores ou outro benefício que tenha sido mapeado pela corporação, e que infelizmente não acontecem de um dia para o outro. É preciso trabalhar em conjunto e adaptar muitas realidades para que a grande mágica aconteça. Dê tempo ao tempo.
A terceira lição mais importante que aprendi é que é preciso engajar as lideranças de maneira que elas se tornem patrocinadoras da inovação aberta. Quem atuou ou atua em corporações sabe que um projeto só consegue durar cinco, dez ou vinte anos quando os líderes acreditam no potencial daquela ideia. José María Álvarez-Pallete, hoje presidente global da Telefónica, foi o criador e um dos grandes “sponsors” da Wayra e se manteve um dos líderes que mais defendia a iniciativa especialmente nos primeiros anos, quando os resultados eram menos evidentes. Por conta do incentivo de importantes lideranças, a Telefónica/Vivo persistiu com a Wayra por tempo suficiente para hoje poder se orgulhar de já ter realizado inúmeros Exits (ou saídas, quando há a venda das startups investidas) no Brasil.
Os resultados só acontecem porque há um esforço em manter a chama da inovação acesa. A Vivo se compromete constantemente a manter a equipe entusiasmada com os processos de inovação, por meio de programas como o Vivo Discover e Vivo Shapers, que formam embaixadores da inovação dentro da empresa. Já fiz parte de algumas destas formações e percebo que quanto mais falamos do assunto, mais mantemos o “calor” e o interesse em fazer parcerias e buscar soluções novas.
Por fim, mas não menos importante, é essencial estar aberto à mudanças, se adaptar e se manter resiliente. Em mais de 10 anos de existência, a Wayra não foi “só” um CVC. Ela começou no Brasil como uma aceleradora de startups, que possuía um coworking voltado para empreendedores e que as ajudava no começo de sua jornada. Conforme o ecossistema de empreendedorismo no país foi amadurecendo, a Wayra também foi ajustando seu escopo de atuação (ou pivotando — jargão que usamos no mercado), aumentando o valor de investimento por empresa e se consolidando em 2018 como a iniciativa de inovação aberta e o CVC, ou seja o braço de investimento em startups que estão preparadas para escalar e que têm fit com os objetivos da Vivo no Brasil e da Telefônica no mundo.
Acredito de verdade que a inovação aberta, em seus diferentes formatos, é uma solução para muitos dos desafios do mercado e das empresas, mas não é algo que vai trazer resultados se não for feito com intenção, cuidado, dedicação e tempo. O sucesso da Wayra só foi possível porque existiu um apoio e uma aposta forte da Vivo/Telefônica neste processo. As lideranças acreditaram e investiram na Wayra, e foi essa confiança e persistência que não só retornou muito do investimento feito lá atrás, mas também gerou muitos negócios entre a corporação e as startups, tornou a Wayra um dos principais players do ecossistema de inovação aberta do Brasil e um dos mais longevos CVCs do país, capaz de investir, co-investir e escalar iniciativas e ideias de sucesso.